sexta-feira, 12 de junho de 2015

Capítulo especial - 12/06

Aviso: Trata-se de um capítulo especial fora da cronologia atual dos livros. Seus acontecimentos se passam após o final (ou talvez, durante) do terceiro livro (contando As Pedras de Elementra como dois livros) e, obviamente, conta com spoilers que podem estragar a leitura de algum desatento cheio de rage no kokoro. O ministério de Saúde adverte não ler se não desejar tal conteúdo adiantado.


. Dia dos laços íntimos entre as pessoas.

"Está mais quente que o normal..."
Ao meu redor, minha cama ardia em chamas. Normal para alguém como eu. Porém, não para alguém como ela. 
Eu não sabia o motivo, o porquê de uma pessoa muito importante para mim estar deitada ao meu lado, em meio as chamas. Ela parecia não se importar. O fogo estaria não a afetando? Com certeza uma novidade.

-Bom dia, namorido. - Melody sorriu ao me ver acordado.

Tentei dizer alguma coisa, qualquer coisa, mas eu não conseguia pronunciar uma única palavra. 
Dei uma olhada ao redor, tentando entender a situação. Péssima ideia. Meu rosto ficou quente, mais do que deveria, e eu sabia a causa disso. Fui tomado por uma imensa vergonha ao notar que estava sem camisa, sendo abraçado por ela, ambos tapados por um cobertor. De relance, notei uma estrela na etiqueta do cobertor azul-marinho. 

-Faz um tempo que não ficamos sozinhos, não é? - os olhos dela encontraram os meus.

Eu não sabia como reagir a aquilo. Ela estava tão próxima... Aquela situação... Aquele ambiente... 
Uma força me fez ir para frente, de encontro a ela. Nossos lábios tocaram-se. 

-Melody, e-eu... - minha voz falhava.

Não consegui completar a frase. Uma voz saiu pela minha boca, mas não era eu quem a dizia.

-Infelizmente. Mas devemos aproveitar o tempo que temos juntos agora, não é mesmo, maguinha?

Rexion.
Neste momento, minha visão mudou. Eu estava de pé, na frente da cama chamuscada. Meus olhos assistiam enquanto Rexion, um ser extremamente parecido comigo, porém mais velho e com cabelos de um tom arroxeado, passava seu braço por trás de Melody, acolhendo-a em um abraço. O rosto de Rexion debochava de mim. 
Sua boca movia-se em silêncio, mas eu sabia a mensagem que me era passada: "Essa você perdeu."
Meu corpo não se movia.
Lentamente, vi duas mãos emergirem entre Rexion e Melody, separando-os. Logo, um cabelo cor-de-rosa inconfundível tomou forma. 
Amy.
Com sua entrada, houve a saída de Rexion. 
Um pouco confusa, Melody processou a situação. Em um ataque rápido, Amy fechou seus braços ao redor de Melody, aproximando-se dela.

-Daisuki. - Amy sussurrou no ouvido de Melody.

Eu não precisava entender o que aquela palavra significava para saber que já era hora de por ordem nestas consciências.

-Selion...? - Melody chamou, como se não pudesse me ver.

As chamas intensificaram-se ao redor do quarto. Amy e Rexion foram longe demais.

-Selion... - a voz estava agora mais perto.

De um momento para outro, vi-me frente a frente com ela. Agora sozinhos. 

-Selion. 

Atrás dela, vi Amy emergir novamente, desligando completamente a atenção de Melody.

-Selion!
...

-Largue-a. IMEDIATAMENTE! - deixei um rugido escapar.


Meu corpo começou a expelir chamas inconscientemente. Respirei fundo, acalmei-me, e fiz as chamas pararem. 
Agora, pensando lucidamente, conseguia perceber que tudo não passava de um simples sonho. E uma figura se projetava não muito longe de mim.

-Mãe Gaia? - eu disse perplexo, bocejando logo depois.

-Você sempre acorda empolgadinho assim? - sua voz era doce como sempre, mas eu duvidava da inocência dessa frase.

Com seus longos cabelos verde-claro, minha mãe me observava de pé a poucos centímetros de minha cama. Sua vestimenta habitual sempre foi um vestido amarelo e marrom, enfeitado com rosas e tendo algumas flores crescendo tanto ao seu redor, quando em sua roupa. Tratava-se da deusa da natureza e da prosperidade, afinal de contas. Mas hoje, ela vestia algo inusitado. 
Vestindo seu corpo, estava um longo vestido de gala prateado. Eu me perguntava o quê ela fazia vestindo algo como aquilo logo de manhã.

-Por que invadiu meu quarto tão cedo? - minha respiração estava ofegante, e eu não havia notado.

-São seis hora da noite. - Gaia notificou, com seus olhos verde-limão brilhando como sempre - Você não deveria ter feito tanto esforço noite passada.

"Noite passada..." fiz força para lembrar do que acontecera.
"A luta contra Rexion." lembrei-me.
Nosso conflito acirrou-se no dia anterior. Eu não lembro muito sobre, mas foi doloroso.

-Ao menos, você se recuperou. Isto é bom. - Gaia lembrou.

Respondi com um balançar da cabeça. Eu não sentia-me feliz em falar logo após levantar. Talvez simplesmente não seja uma boa ideia acordar dragões de seu sono, embora sair daquele sonho estranho tenha sido algo bom. 

-Sei que foi uma semana estressante, mas isto está para mudar! Hoje você irá vestir isto aqui. - Gaia deixou cair por cima de meus pés uma roupa preta e branca dobrada - Sem questionar, por favor. É um dia muito especial!

"Dia? Que mês estamos, aliás?" pensei, confuso.

-Tolinho, você ainda não sabe? 

Neguei com um movimento de cabeça. 

-É a celebração do dia dos laços íntimos entre as pessoas. - Gaia explicou, com entusiasmo - Você o conhece por... Como era mesmo... "Dia dos namorados"?


...

Eu entendia a data em questão. Eu entendia o motivo das pessoas conosco reunidas. Mas eu não conseguia entender um ponto crucial da operação:

-Por que EU estou de TERNO? - deixei um rugido baixo escapar.

Uma das piores invenções do homem: a vestimenta social.

-Não esqueça da gravata. - uma voz suspirou, vindo de trás de mim.

Um sujeito de altura levemente mais elevada em relação a minha adentrou à meu quarto. Igualmente a mim, ele usava um terno idêntico ao meu, mas era possível encontrar muitas outras semelhanças entre nós.

-Rexion. - bufei.

Algo estava errado. Eu não lembro do resultado da batalha na noite anterior. Só lembro de começar um ataque. Algo estava errado. 

-Gaia gosta de ternos, percebeu? Já viu Samsara sem o dele, aliás?  

Parando para pensar, ele tinha razão. O par de Gaia, o deus da luz e da ressurreição, Samsara, sempre usou esta insuportável (falo isto por mim mesmo) roupa em todas as vezes que o vi, não que tenham sido diversas.
Rexion e eu estávamos tendo uma conversa normal. Normal até demais. Isto deveria ser possível? Eu não lembrava de nada sobre a noite anterior e isso me preocupava.

-O quê irá acontecer hoje? - perguntei.

Rexion encarou-me, confuso.

-Eu lhe dei uma chance. Uma única chance. Mas não sou nenhuma espécie de vidente. 

Dito isso, Rexion saiu do quarto, deixando-me cheio de dúvidas não respondidas. 

-Não vá me dizer que a pancada foi feia demais? - Rexion exclamou, já no corredor.

O som de seus passos diminuíram até desaparecer completamente. Sozinho e confuso, fui imerso no silêncio.
"Dia dos namorados." repeti em minha mente.
As palavras de Rexion poderiam ter algo ligado a este dia? A parte sobre uma "única chance", talvez? 
Ignorando este fato, eu não tinha motivo para participar deste dia. 
Quando a palavra amor veio a minha cabeça, era claro a pessoa à qual eu fazia ligação. Mas era impossível. 
A cerca de um ano atrás, após uma série de incidentes, as memórias de Melody foram apagadas e substituídas, junto da de muitas outras pessoas. O sentimento mútuo que parecia existir entre nós foi levado junto de suas memórias. Foi difícil fazê-la voltar ao meu lado novamente, mas eu consegui. Porém, após isso, meu lugar foi tomado por Rexion, alguém superior a mim neste assunto. Ao menos, em nosso estado atual. 
Seria está a "chance" a qual ele mencionou? Mas, isto faz sentido? Lembro-me de uma luta, mas não do motivo dela, ou como ela acabara. Estas informações poderiam ser muito úteis agora.
De um momento para outro, comecei a ouvir vozes vindas do corredor. Muitas delas, em vários tons e volumes. Algo estava acontecendo. Apressei-me a seguir em direção ao saguão principal do edifício onde eu estava. Tratava-se do Monastério Branco, conhecido por mim como Torre de Luz, o edifício onde localizava-se a residência dos principais deuses do local, Samsara e Gaia, meu planeta natal, Felixia.
No corredor, fui parado por um conhecido. Um sujeito alto e robusto, usando um terno preto com linhas vermelho-fogo ao redor do colarinho e ao redor dos punhos. O sujeito tinha cabelo bagunçado em tons de preto com uma pequena inclinação ao laranja. Este, era Ignis. Ele agia como uma espécie de conselheiro para mim, embora eu cuidasse dele durante parte do tempo. Agora era um exemplo destas ocasiões, pois ele segurava uma garrafa estranha e parecia um pouco embriagado.

-Como vai seu plano? - ele perguntou diretamente.

-Meu plano? - indaguei, sem resposta para dar.

-Derrotou ele, agora é só ir para cima dela. Claro, evitando a outra ela. - Ignis mexia as mãos enquanto falava.

-Ignis, somos do mesmo sangue, então eu tenho permissão para dizer que compartilhamos do mesmo sentido de idiotice, mas você está fugindo do padrão. - respondi-o.

-Magoou. Mas enfim, vá até ela. Aproveita que está bonito! - ele fez sinal com o polegar para cima e abriu um grande sorriso - Eu sei o quanto você sente remorso por aquele lance das memórias. Mas agora é a sua chance!

-Ignis, eu realmente não lembro de nada de ontem. O quê quer que eu faça?

Ele tirou sua gravata com o emblema dos dragões divinos, uma espécie de asa cujo estilo imitava a pintura rupestre da Terra, e a colocou ao redor de meu pescoço.

-Agarre a chance! Ganhou uma vantagem sobre o Rex, mas saiba que não vai durar muito. Ele vai acabar extrapolando se você não fizer algo, e ainda tem o fator... 

Deixei-o falando sozinho e desci as longas escadas. Peças começavam a encaixar-se em minha mente. 

-Você se sente mal por aquela decisão, não é? - Ignis gritou para mim.

Parei para ouvir suas palavras.

-Saiba: a nossa linhagem é a mais sofredora de todas as divindades. Nenhum Deus dragão viveu feliz da maneira que quer. Nenhum conseguiu viver ao lado de alguém. Alguns muito menos encontraram alguém assim. - Ignis contou, seu tom de voz exalava energia negativa - Esforce-se. Você pode ser o primeiro a conseguir isto.

E então, voltei a descer as escadas.
...

Percorri o caminho até o saguão principal. Quando cheguei, era impossível conter minha surpresa. Deuses, seus servos e filhos, muitos deles, espalhados pelo saguão. Normalmente, grande parte deles assumia formas de monstros gigantescos e grandiosos, estátuas animalescas e poderosas, dentre outras criaturas semelhantes, mas em seu tempo livre, criavam uma forma mortal para poder sociabilizar com os outros mais facilmente, embora alguns deixassem características próprias a mostra, como era o caso de Ruby, a deusa da caça e da beleza, com suas orelhas negras de coelho sempre amostra.
Passeei com os olhos ao redor, procurando identificar um lugar onde fosse seguro passar. Alguns deuses realmente não gostavam de mim. 
Determinei o lugar dividido em facções. Em um canto, eu só notava deuses andando em pares, casais. Em outro, haviam os filhos destes e seus servos, que seriam criaturas inferiores criados ou acolhidos pelos deuses em questão. No último grupo, notei membros do Grand Elementra, alguns deuses com quem tínhamos afinidade e alguns servos e criaturas inferiores solitários.
Cruzei o salão em sua direção. Eu não sabia o que estava acontecendo. Seria um baile comemorativo? Eu nunca tinha visto tantas criaturas juntas antes. 
Enquanto seguia em frente, identifiquei Gar olhando na minha direção. Era um pouco sinistro, pois Gar não possuía olhos, e mesmo assim ele sorriu, como se pudesse me ver. O quê eu não duvidava em momento algum. Seus olhos eram sua mente. 
"Você demorou. Estava com alguma garota que não conhecemos por acaso?" Gar cumprimentou-me, invadindo meus pensamentos.
"Não tenho tempo. Eu preciso falar com Melody. Onde ela está?"
Eu precisava vê-la. Ter contato com ela poderia clarear minha mente, eu sei disto. 
"Ela não combinava muito com esse lugar, talvez não tenha gostado da galera. Tem uns seres bem barra-pesada por aqui, isto é fato. E..." Gar contou, enrolando com vários detalhes inúteis. 
"Diga de uma vez onde ela está, eu meio que preciso correr antes que outra pessoa a alcance." reclamei com ele por pensamento. 
"Ela foi para a floresta aqui atrás. Richard e Amy foram com ela, acho. Ah, você viu Raida por aí? Hoje ela não poderá enfiar a espada na minha cara quando eu falar com ela! It's my turn!" 
Não o respondi, até porque não possuía as respostas exigidas. Mudei meu rumo para fora do edifício. Com cuidado para mãe Gaia não me notar e me puxar de volta, sorrateiramente saí pela porta dos fundos e avancei em rumo à entrada da floresta. Era provável onde ela estava. Na clareira.

-Por aqui e... - narrei meu caminho pela floresta.

Parei quando encontrei-a. Richard não estava a vista, provavelmente estava descansando mais a fundo da floresta. Melody, por outro lado, estava logo a minha frente, sentada na grama limpa e bela da floresta criada pessoalmente por Gaia.
A luz pálida da lua iluminava seu corpo, que observava as estrelas, perdida no meio de sua infinidade brilhante. Ela usava um vestido preto simples. Eu nunca tinha presenciado um momento com ela usando qualquer roupa do gênero vestido ou saia. De qualquer jeito, uma coisa era certa. Ela estava linda. Ela, de todas as pessoas, para mim, era de longe o exemplo mais puro de beleza e perfeição. 

Respirei fundo e caminhei até ela.
Automaticamente, ela ouviu meus passos e me notou por perto.

-O-olá, Melody. - eu a cumprimentei, sem jeito. 

-Selion. - ela dirigiu sua atenção a mim - Você está bem? Eu fiquei sabendo da luta de ontem. Você demorou demais para acordar. Ficamos com medo que algo grave pudesse ter acontecido... 

Sua voz parecia aliviada. Feliz por ter boas notícias.

-É um pouco difícil acabar comigo. Sabe como é, cabeça dura, escamas resistentes... - brinquei, tentando fazê-la sentir melhor - Não se preocupe comigo, livrar-se de uma praga não é tão fácil assim.

-Não acho você uma praga, mas fico feliz em saber que não me livrarei de você. Não seria a mesma coisa sem nosso dragão pavio curto por perto. - Melody confessou.

Meu coração começou a bater mais intensamente. Provavelmente, Flamus estava cooperando para isso. 
Aquela conversa, estava tomando o mesmo rumo que eu via? 

-As estrelas daqui não são como as outras, não é mesmo? 

-Sim. - ela respondeu - Elas são incríveis. 

"Como você."
Seria bom conseguir pronunciar as palavras que vinham a minha mente. Mas um bloqueio em minha mente me impedia. 

-Você também gosta delas? - Melody perguntou, observando-as.

-Bastante. Durante o tempo em que passei viajando, elas foram minhas únicas amigas. Minha única companhia. Por mais que algumas pessoas bondosas me oferecessem abrigo, eu simplesmente não podia aceitar. Não era a mesma coisa sem esse teto acima de mim. - respondi-a.

Não houve resposta alguma.

-Falei alguma besteira...?

-Não. Eu gostei do que disse. - ela sorriu.

Eu estava para derreter com aquele lindo sorriso brilhando sob o luar. 

-Eu passei no seu quarto enquanto você repousava, depois da luta, a pedido de Gaia. - Melody contou - Eu pensei ter ouvido meu nome. Loucura, não é? 

-Talvez nem tanto... - minha voz mais pareceu com um sussurro.

Lembrei-me do sonho estranho. O modo como Rexion e Amy roubaram ela de mim tão facilmente. Eu não podia deixar esse acontecer tornar-se realidade. 

-Está ficando um pouco frio. Eu não entendo o porquê dessas roupas chiques. - Melody abraçou a si mesma para se aquecer.

Ela olhou para mim e seu rosto pareceu corar. Provavelmente era só impressão minha. 

-Eu me perguntava a mesma coisa quando acordei. Bom, fazer Gaia feliz uma vez não vai ferir ninguém. - com esforço, continuei a falar - E... Sabe... Digamos que... Você ficou ainda mais bonita assim...

-S-Selion...? - agora nitidamente eu via o rosto dela enrubescer. 

Eu conseguia sentir que o meu não estava muito diferente. 

-Você estava com frio, não é...? Sabe, eu sou um dragão, ou quase isso. - eu sentei-me mais próximo dela - T-Talvez, caso você não se importe, eu possa te ajudar com o frio.

Seu corpo começava a tremer. 
Com cuidado, movi o braço por trás de seu pescoço. Usei uma pequena quantia do poder de Flamus para expelir calor de meu corpo, como se eu estivesse agora ligado na função aquecedor.
Ela me agradeceu e ficamos em um estranho silêncio, encarando o céu.

-Melody. Eu acho que tem uma coisa que preciso dizer para você. - eu disse, nervoso.

-O quê seria? - ela perguntou.

Seus olhos lilás encontraram os meus. Eu só precisava pronunciar a frase certa. Mas minha cabeça estava entrando em pane. As palavras fugiram de mim. Eu não conseguia encontrar um meio para me expressar. 
Foi nessa brecha em que ele apareceu.

-O quê está acontecendo aqui? - Rexion perguntou.

"Que espécie de 'chance' falha é essa?!"
No susto por sermos encontrados, Melody afastou-se de mim. 

-Eu estava procurando por você, maguinha. Eu preciso trocar algumas palavras, é importante. - Rexion estendeu sua mão para ela - Venha comigo, por favor.

-Selion precisava me dizer algo também. - Melody ignorou o apelo de Rexion.

-Eu já conversei com meu meio-irmão aqui, e para ele está tudo bem. Não é, Selion? 

Melody, relutante, levantou-se do chão, cobrindo o braço com sua mão por causa do frio (indícios da presença de tia Svanna, deusa do frio e da seriedade). 
Eu não consegui falar. Caso eu abrisse a boca, a raiva poderia me comover e criar uma outra luta. Eu realmente não queria aquilo. Levantei-me também. 
Vagarosamente, Rexion foi levando Melody para longe de mim, deixando-me sozinho. 

-Não era assim que deveria acabar. - murmurei irritado.

Embora eu parecesse pronto para isso, algo dentro de mim impediu-me de desistir. Eu os segui pela trilha onde haviam seguido. Eu ouvia as vozes dos dois, porém somente frases incompletas. Algumas me mencionavam.
Então, eu ouvi algo semelhante a isto:

-Permita-me tentar uma última vez. Não haverão erros ou falhas. Só quero poder ter você ao meu lado novamente.

Avancei mais rápido, seguindo suas vozes.
Ao chegar lá, via Melody e Rexion muito próximos. Com suas mãos, Rexion prendia os braços de Melody, que estava escorada contra uma árvore de casca lisa. Estava escuro demais para ver suas expressões. A única luz do lugar era produzida pelos vaga-lumes e por fraquíssimos feixes de luz do luar, que escapava pelos galhos das árvores, cuja forma lembrava uma cúpula.

-Isso não é certo, Rex. Nós não... - Melody parecia hesitar.

Rexion calou sua boca com um de seus dedos, e encostou sua testa na dela.
As imagens escuras dos dois misturaram-se em uma. Senti-me muito mal. Era tarde demais. 
Em um momento de fraqueza, Flamus reagiu. Meu corpo exalou chamas. Com certeza mãe Gaia não gostaria de um incêndio em sua floresta, mas não era momento para pensar nisto. 

-S-Selion? - Melody chamou - É você? Eu não...!

-Não se preocupe. Deixarei vocês a sós. - soquei a primeira árvore que apareceu à minha frente.

Uma cratera flamejante foi deixada para trás, junto de uma árvore quebrada ao meio como um palito. Frustrado, chateado e fora de mim, caminhei na direção oposta para o centro da floresta. Meus passos queimavam a grama, praticamente assinando meu nome em uma mensagem de "Eu estive aqui".

-Me pergunto se foi assim com os outros participantes da linhagem. - sentei no centro da clareira de pernas cruzadas.

O fogo havia queimado toda a grama ao meu redor, fazendo parecer o local onde um meteorito teria caído. Atrás de mim, queimando à fogo baixo, meus passos incandescentes no solo continuavam marcados. 

-Eu cheguei mesmo a pensar que... 

Bati meu punho com força no chão. 

-Eu fui muito lento. Era tarde demais. - por dentro, minha raiva aumentava.

Meu coração parou. Senti uma presença ao meu redor, não muito longe de mim. 

-Selion, está tudo bem...? - Melody perguntou.

-Por que veio? Rexion está te esperando, não está? - grunhi.

-Isso... Você... Selion, você está com... ciúmes? - Melody perguntou, agora à meu lado.

Minhas chamas intensificaram.

-Mero engano seu! Não há motivos para sentir "ciúmes"! - respondi-a, elevando acidentalmente minha voz.

Ela riu. 

-Como eu disse mais cedo, não teria graça sem nosso dragão esquentadinho por perto. - Melody sentou-se ao meu lado.

Ela já teve experiências semelhantes comigo em estado de irritação. Ela já conhecia fatos como minhas chamas não a queimarem. 

-Você está perdendo tempo. É a noite perfeita para você ficar com ele

"Não, não!" eu pensava em agonia. 
Dentro de minha cabeça, eu conseguia prever o quanto a conversa poderia acabar mal. Mas eu não conseguia me conter. Eu precisava parar antes de acabar afugentando-a para longe de mim.

-Fiz Rexion voltar para a Torre de Luz. Eu já estava feliz em poder conversar com você. - Melody confessou - O quê me lembra, você ia me falar alguma coisa, não é mesmo? 

-Não importa. Não era importante. - sem querer, a fala acabou parecendo um resmungo.

Nossos olhos encontraram-se acidentalmente. Minhas chamas simplesmente apagaram. Não havia mais motivo algum para estar estressado ou irritado. Qualquer sentimento negativo foi eliminado. Somente ela conseguia fazer isso comigo.    
Agora que conseguia pensar racionalmente, respirei fundo.

-Melody, eu não sei o que aconteceu ontem, mas há uma informação que eu venho guardando de você já faz um bom tempo. 

Esta era a segunda vez que eu falava sobre isso com ela. Porém, na primeira vez, Flamus havia feito tudo por mim. Este momento estava nas memórias que ela perdeu. Agora era minha chance de falar por mim mesmo. 
É muito mais difícil do que pensei.
Eu só precisava pronunciar as palavras certas. Era o momento ideal. Um cenário perfeito. Ela estava a poucos centímetros de mim. Eu só precisava finalizar.

-Seu rosto está vermelho. - Melody comentou em voz baixa.

Ela dizer isto somente me fez corar ainda mais. Perceber que seu rosto também começava a enrubescer deixou tudo ainda mais difícil.

-Melody. - respirei fundo - É tu-tudo muito confuso para mim, mas... E-Eu acho que gosto de você. Gosto m-muito mesmo. 

Nossos rostos estavam tão vermelhos, que se alguém aparecesse agora, poderia nos confundir com dois tomates em trajes elegantes. 

-V-Você não deve se sentir obrigada a se importar com isso, m-mas eu precisava que soubesse. - finalizei.

Um estranho silêncio dominou o lugar. Estava tão quieto, que eu conseguia ouvir nossos corações pulsando aceleradamente. 

-Eu sei sobre sua situação com o Rex. Você pode simplesmente me dispensar e eu não vou incomodar vocês dois. 

Eu dizia aquelas palavras, mas por dentro, implorava para que elas não se realizassem.
Melody abraçou-me. 
Fui pego de surpresa, totalmente despreparado. Acabei cambaleando para trás e caindo no chão.

-D-Desculpe! - desculpei-me, sem jeito.

Ela também estava surpresa, mas nenhum de nós ousou mover-se. 
O corpo dela tremia. Eu não percebi a mudança repentina na intensidade do vento. Eu a abracei, cedendo calor para ela. Ela estava tão surpresa quanto eu por aquela situação, mas nenhum de nós ousou fazer qualquer movimento. 
Passaram-se segundos, minutos, e eu sentia como se pudesse permanecer horas ali com ela. 
Chegou um momento em que eu senti a necessidade de agir. Talvez fosse Flamus influenciando minhas decisões. De qualquer maneira, eu não ligava para o local de onde vinha essa sensação.
Meu rosto e o dela estavam tão próximos.

-O quê você faria se algo incomum entre nós acontecesse...? - perguntei, finalmente.

-Eu r-realmente não sei. - ela fechou seus olhos.

Nossos lábios encontraram-se em um beijo profundo. Minha mente ficou em branco. Meu coração batia cada vez mais forte. Nossos corpos foram envoltos por chamas vermelhas e azuis. Um dos melhores momentos de minha vida. 

-Selion... - ela deitou-se ao meu lado, abraçando-me - Eu também compartilho de sentimentos por você...

Pensei em meu sonho. Estávamos em uma situação muito parecida, porém fomos interrompidos por Rexion e Amy. Mas desta vez, Rexion saiu da jogada, e eu nem sequer havia visto Amy. 

-Eu amo você. Gostaria de passar o resto da eternidade ao seu lado. 

-Nós podemos tentar. 

E assim ficamos. O tempo pareceu parar de correr. De qualquer maneira, aquilo não nos importava. Sentia-me realizado por finalmente poder revelar o que sinto para minha pessoa amada, e ainda mais feliz por saber que agora eu poderia estar junto dela.


...

Prólogo

Já estava tarde quando voltamos juntos para a Torre de Luz. A essa altura, o volume de deuses havia diminuído. Ao passar da meia-noite, mais ninguém era obrigado a permanecer lá. 
Ao entrarmos no saguão, fomos recebidos por uma cena incomum. Gaia e Samsara, juntos ao mesmo tempo. Este encontro nunca antes havia sido presenciado por mim.
Mãe Gaia quase sempre está por perto, já pai Samsara... A situação com ele é mais complicada. Como Deus da luz e da ressurreição, e ainda por cima o central entre todos os deuses, Samsara sempre estava ocupado. Tive de esperar cerca de um ano para poder ter contato direto com ele na primeira vez que estive nesta ilha flutuante, Outervens

-Pai Samsara. - eu disse.

Alguns de nossos amigos e conhecidos estavam logo atrás. Eu e Melody estávamos tão envolvidos, que nem notamos nossos braços entrelaçados. 

-Selionis. - meu "pai" sorriu para mim.

Seus olhos estavam fechados, como sempre. Eu nunca os havia visto abertos. Boatos de que seus olhos são tão belos, mas tão belos, que até mesmo deuses desmaiam ao presenciar seu esplendor. Nos piores casos, eles são evaporados.

-Eu disse que o terno cairia bem nele, olhe só. - Gaia cutucou Samsara com o braço.

Senti-me muito envergonhado. Ao olhar para Melody, percebi que o sentimento era mútuo.

-Meu tempo por aqui esgotou. - Samsara encarava seu pulso, como se decifrasse a posição dos ponteiros de um relógio, embora não houvesse relógio algum e seus olhos continuassem fechados - Sinto muito por ter de partir.

Samsara beijou a testa de Gaia, e caminhou lentamente, parando ao meu lado.

-Por favor, não me façam ter que abençoar nenhum nascimento vindo de vocês tão cedo. - Samsara deixou uma pequena risada escapar.

Minha timidez fazia minha vontade ser morrer. Mas eu tinha um destino muito melhor vivo.

-Você acha mesmo isso? - uma voz soluçava, não muito longe de onde todos estavam agrupados - Sabe, talvez nós pudéssemos encerrar a noite de uma maneira um pouco melhor. Diga-me, o quê acha de garras?

Ignis havia extrapolado um pouco além de seu limite. Junto dele, uma mulher não conhecida por mim deu a ele um pesado tapa, deixando uma marca vermelha em seu rosto. Ele caiu no chão, mas logo se levantou, um pouco zonzo, mas bem. Não demorou muito para ele me notar e dizer "Parabéns, campeão!". Logo após isso, ele desapareceu em uma dança de chamas. 

-Está ouvindo algum barulho estranho? - Melody perguntou - Como um gritinho. 

Foquei minha audição de dragão. Engoli em seco. Algo vinha correndo em minha direção. Afastei-me de Melody rapidamente e virei-me para trás. 
Só tive tempo de ver um pé voando em minha direção.

-LADRÃO DESALMADO SEM CORAÇÃO! - Amy gritou, enfurecida. 

Caí de costas no chão, sendo pisado por suas sandálias extremamente dolorosas.
Acho que uma luta com Rexion teria doído um pouco menos.

-Amy, espera, para! - Melody e Richard tentavam controlá-la.

Por fim, desmaiei, simplesmente apaguei. Ao menos dessa vez eu tinha certeza de uma coisa: eu não me esqueceria do que aconteceu na manhã seguinte.

P.S.: Juh, eu realmente gostaria de saber sua opinião sobre o capítulo... Ele foi meio que feito especialmente para você, e eu gostaria de ter notícias suas... Tudo bem se não for possível, mas já faz tipo 2 meses ... Sinto sua falta.

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